Fonte – LANCENET
Publicada em 2/10/2010 às 11:20
Morumbi completa 50 anos de existência neste sábado (Crédito: Tom Dib)
Anônimos que fazem a história do Morumbi
LANCENET! mostra dois funcionários que são parte da história cinquentenária do estádio tricolor
O Morumbi tem uma legião de torcedores quase religiosos: em todos os jogos no estádio estão presentes.
Possivelmente, nenhum deles faça ideia que Jerson da Costa Ramos e Edson Batista Soares existem. E há muito tempo a dupla está sempre lá.
Há exatos 50 anos, no dia 2 de outubro de 1960, o Morumbi recebia seu jogo inaugural e Peixinho, atacante do São Paulo, eternizava seu nome como autor do primeiro gol. Gol que só foi registrado graças a Jerson.
Hoje, o senhor de 75 anos trabalha em uma sala escondida, discreta no estádio, a do arquivo histórico. Na época, era funcionário do departamento financeiro e, sem voluntários, ofereceu-se para uma missão inglória na tarde da abertura do palco.
– Precisava de alguém para mexer o placar. Eu ficava numa escada de madeira, que balançava com o vento. Quando saiu o gol, fiquei feliz, mas rezei para ficar 1 a 0. A cada vez que tinha de mexer no placar, quase caía – relatou o “co-autor” do gol, nitidamente satisfeito pelas lembranças.
Jerson, são-paulino ferrenho, ao menos viu o jogo com dificuldades. Algo que Edson há 19 anos não pode fazer, mesmo presente no Morumbi em quase todas as partidas do time.
Maguila, como é chamado por todos no local, é o ascensorista do elevador da casa tricolor. Enquanto gols, dribles e títulos ocorrem dentro do gramado, ele sobe, desce… E sofre com seu celular. Sinal de modernidade, pois aposentou o rádio de pilhas.
– Não posso ver o jogo, né?! Fico dentro do elevador o tempo todo, ouço rádio e presto atenção no grito da torcida. Quando gritam forte eu comemoro – conta o simpático Edson.
O ascensorista era camelô até os 25 anos, em 1991, quando começou a trabalhar no Morumbi. De lá, tira o sustento dos quatro filhos. Um deles já trabalha no setor de informática do São Paulo. Maguila transporta atletas, dirigentes, torcedores. Certa vez foi cercado por palmeirenses no elevador. Por outro lado, já ganhou presente de uma estrela mundial.
– Ganhei uma toalha da Madonna quando ela veio fazer show. E a gente nem falava a mesma língua – disse.
Jerson e Edson não têm o talento de Rogério Ceni, Raí e companhia, mas seus nomes também estão escritos na história do cinquentenário.
Bate-bola com Jerson – Responsável pelo arquivo do Morumbi
L!: Qual foi sua participação na construção do Morumbi?
Jerson: Trabalho no São Paulo desde 1955 e o clube naquela época tinha 40, 50 funcionários. Para administrar tudo. Então todos nós colaboramos de várias maneiras. Eu, no dia do jogo, fiquei no placar.
L!: Como assim, ficou no placar?
Jerson: O diretor financeiro me mandou achar alguém para trocar os gols no placar. Procurei, procurei, mas todo mundo estava ocupado com outras coisas. Faltavam 20 minutos para começar o jogo e ele falou “Se vira.” Então fiquei eu mesmo. Era uma escada de madeira apoiada no placar, ela balançava com o vento.
L!: E você ficou lá o jogo todo?
Jerson: Claro, coloquei o gol no placar e fiquei rezando para acabar 1 a 0 porque quase caí. Falo para o Peixe (autor do gol) que torci para não fazer mais, fui um são-paulino no muro naquele dia (risos).
L!: Como era trabalhar no Morumbi na década de 60?
Jerson: Na verdade, a sede administrativa do São Paulo só passou para da Avenida Ipiranga para o Morumbi em 1978. Mas antes, quem trabalhava lá só tinha um ônibus para ir embora. Ele passava às 18h e levava os mesmos 20 passageiros de sempre. Quando um não estava no ponto, ele até esperava porque quem perdia, tinha de dormir no estádio.
Bate-bola com Maguila – Ascensorista do Morumbi
L!:O movimento do elevador durante os jogos é muito grande?
Jerson: Pensam que não, mas trabalho o tempo inteiro. Atendo pessoas que passam mal e precisam ser transportadas, dirigentes sobem e descem. É muita gente mesmo.
L!: Mas você nunca saiu para ver um gol, uma comemoração? Qual foi sua maior alegria aqui?
Jerson: Ah, não podemos. Às vezes a gente só dá uma olhadinha no jogo, mas ouço mesmo no celular. Eu me lembro da campanha na Libertadores de 2005, vibrei bastante quando tiramos o Palmeiras e quando fomos campeões.
L!: Você deve saber de muitos segredos transportando Juvenal, jogadores…
Jerson: Ah, mas é a privacidade deles, né? Não falamos, não pode.
L!: Já tem intimidade com algum jogador?
Jerson: O Rogério Ceni é meu amigo. Ele tem 20 anos de São Paulo e eu tenho 19, sou quase igual a ele. E ele já morou aqui, então nos conhecemos. Ele já me deu algumas camisas, estão guardadas em casa.
L!: Por quanto o senhor as vende?
Jerson: Ah, não vendo. Não tem preço (risos).
MEU JOGO INESQUECÍVEL NO MORUMBI
André Kfouri – Colunista do LANCE! |
Eu tinha 11 anos. Já tinha ido ao Morumbi várias vezes com meu pai. Aos domingos, almoçávamos na casa de minha avó e saíamos com pressa para o estádio. Era meu momento favorito da semana: um jogo de futebol e, depois, noite adentro na redação da revista Placar, que ele dirigia. Período que sedimentou minha escolha profissional.
Mas naquela noite, em 1984, fomos ao Morumbi não para ver futebol, mas para ver um jogo de vôlei. Não era um jogo qualquer. Brasil x Estados Unidos, numa quadra montada no centro do gramado. Nossa “geração de prata” contra os então campeões olímpicos, numa revanche da final dos Jogos de Los Angeles. E a preliminar foi um jogo de basquete, entre Corinthians e Flamengo.
O que me marcou naquela noite é que foi a primeira vez que pisei no gramado e olhei aquela imensidão. Quase 50 mil pessoas foram ao Morumbi para ver um jogo de vôlei num estádio de futebol. Lá de baixo, eu me impressionei tanto que nunca mais esqueci. |
Mauro Beting – Colunista do LANCE! |
Palco da minha primeira final num estádio. Empate sem gols contra o dono da casa garantiu o bi brasileiro, em 1973. Época em que, para o meu clube, ano sim, ano não, ele era campeão. Como seria, no final de 1974, dez meses depois, contra o maior rival. Gol fenomenal de Ronaldo.
Mas, a partir de 1976, era ano não, o outro também não. Foi naquele agosto que o Palmeiras ganhou do Corinthians por 2 a 1. O primeiro jogo da fila. Golaços de Jorge Mendonça. No segundo, chorei de felicidade pela obra prima. Sem saber que dez anos depois seria de raiva pelo título da Inter de Limeira.
Lá eu vi o Corinthians voltar a ser ainda mais Corinthians, no Brasil e no mundo. Vi o São Paulo ser soberano mundial três vezes longe de casa. Mas só pude ver o Palmeiras voltar a ser Palestra naquele Dia dos Namorados de 1993. Quando não vi mais nada depois do quarto gol de Evair. E nada mais lindo vi em estádio depois daquele 12 de junho. |
Vitor Birner – Colunista do LANCE! |
Fugia de casa para ver o São Paulo. Pegava o Jd Colombo ou o CMTC azul no Anhangabau. O cobrador deixava pular a catraca.
O futebol era mais pobre, gostoso e feliz. Do povão! Não tinha o moralismo hipócrita nas discussões sobre disputas de bola e metrossexuais pouco competitivos.
A final da Libertadores São Paulo x Newell´s Old Boys me marcou demais.
Cheguei cedo. Necessitava viver a decisão. A proximidade com o gigante de concreto diminuía a agonia. Abriram os portões ao cair da tarde. Sentei no lugar de sempre para espantar o azar. Vi o Morumbi lotar. Primeiro a arquibancada sem divisões. Depois as numeradas, geral e cativa ficaram tricolores. Os hinchas também compareceram.
Que jogo dramático! Ansiedade antes, nervos durante, desespero nos ataques dos leprosos e a esperança no gol de Raí terminaram com Zetti pegando o pênalti cobrado por Gamboa.
Alucinados, mais de 100 mil pessoas explodiram de alegria. O Morumbi é um santuário de emoções. |
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